domingo, 20 de dezembro de 2015

A religião completa e acabada

 

Não existe uma “religião completa”, ou uma “religião total”, porque a capacidade do ser humano de perceber ou compreender a Realidade é incompleta. Por isso, o Cristianismo, ou melhor, o catolicismo não é uma religião completa. Mas existem religiões que integram em si mesmas conceitos mais ricos e mais complexos do que em outras religiões; por isso é falso que se diga que todas as religiões são equivalentes, e muito mais falso é que se diga que são todas semelhantes.

Embora nenhuma religião seja completa ou total, o catolicismo integra em si mesmo a maior complexidade conceptual entre todas as religiões.

Mas estou de acordo com o Frederico Lourenço: o Judaísmo interferiu mais negativamente do que positivamente no Cristianismo; mas não nos podemos esquecer de que o Cristianismo não surgiu como uma nova religião, no tempo imediatamente posterior a Jesus Cristo: os seus seguidores entenderam o Cristianismo como uma reforma do Judaísmo. Só mais tarde, com a intervenção de S. Paulo na defesa dos gentios, e depois com a patrística, o Cristianismo se tornou autónomo do Judaísmo.

O Cristianismo primordial recebeu a influência da filosofia grega, mormente do neoplatonismo; e foi esta influência que permitiu ao Cristianismo a conciliação racional entre os conceitos de imanência e transcendência. De certa forma, não podemos dizer que o catolicismo seja imanente ou transcendente, mas antes que é a súmula ou a síntese destes dois conceitos. E podemos dizer também que a influência da filosofia grega no catolicismo representou um corte final e definitivo com o Judaísmo.

A Reforma protestante representou um retrocesso no aspecto doutrinal em relação ao catolicismo.

A Reforma recuperou aspectos do Judaísmo e do Antigo Testamento que o catolicismo tinha colocado de lado, por um lado, e por outro lado eliminou determinadas influências da filosofia pós-socrática do catolicismo.

O Judaísmo do Antigo Testamento foi eminentemente imanente e não concebia claramente a vida espiritual transcendente após a morte física. Jeová era um deus imanente; e a noção de “ressurreição dos mortos” era também imanente, entre os fariseus do tempo de Jesus Cristo. A noção de “transcendência” de Deus só se afirmou no Judaísmo depois da destruição do tempo de Jerusalém em 70 d.C e com a diáspora judaica.

É neste sentido que se pode considerar o catolicismo a religião mais rica e mais complexa em termos doutrinários, porque compreende em si mesma a imanência (por exemplo, o monismo do Budismo) e a transcendência (o dualismo da Realidade). Esta conciliação católica e racional entre a imanência e a transcendência introduziu uma diferenciação cultural decisiva e civilizacional.

Porém, o que a actual elite da Igreja Católica — sob a batuta do cardeal Bergoglio — está a tentar fazer é a simplificação da doutrina católica, transformando-a em uma ideologia política, emulando de certa forma a Nova Teologia que surgiu do Existencialismo da primeira metade do século XX. É neste âmbito de simplificação ideológica da doutrina católica que se insere o Frei Bento Domingues.

Pergunta: ¿será possível que a doutrina católica possa absorver novos conceitos que a completem melhor, enquanto religião?

Resposta: é possível. Mas para isso não precisamos, na Igreja Católica, de uma elite da estirpe actual; não precisamos — como acontece hoje — de uma elite que oponha a acção ao conhecimento, mas antes que concilie o conhecimento com a acção. Bento XVI foi um papa do conhecimento; o papa-açorda Francisco é um papa de acção; precisamos de uma conciliação entre extremos, por um lado, e por outro lado precisamos de reformas doutrinárias que adeqúem a doutrina da Igreja Católica à Realidade espiritual conhecida (e não à realidade política ou politicamente correcta). Ou, como diz Nicolás Gómez Dávila: “a invenção foi inventada de uma vez para sempre; a ideia tem que ser reinventada a cada vez no tempo”. Há aspectos da Realidade conhecida pelo Homem desde sempre que ainda não foram incorporados na doutrina do catolicismo, embora Jesus Cristo os tivesse claramente referido.


O Frederico Lourenço está à procura de uma religião que se adeqúe à sua idiossincrasia — assim como o canibalismo era uma característica religiosa que se adequava a uma determinada idiossincrasia de alguns povos primitivos. Ele procura uma religião feita à medida no alfaiate e que se adapte ao seu corpo (o que é próprio do narcisismo contemporâneo); e se uma religião não se adapta à sua idiossincrasia pessoal, é porque está parcialmente errada e é irracional.

A lógica (e a matemática), por exemplo, não é um produto da razão humana, mas antes é mais inteligente do que a razão humana; a razão não depende do contexto natural do seu surgimento. Portanto, a razão humana não se pode limitar àquilo que a Natureza fez dela, porque ela participa na dimensão intemporal (ou seja, dimensão transcendente) do espírito.

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