segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

O Homem foi criado à imagem de Deus

 

"O acaso é a vontade de Deus".Pedro Arroja


A “vontade de Deus” pode ser directa ou indirecta. Quando é directa, estamos em presença do milagre. E quando é indirecta, a vontade de Deus é a causa de tudo quanto existe (e não só do “acaso”), o que engloba o determinismo das leis da natureza, mas também o livre-arbítrio (a liberdade) da consciência. Nem sempre “o acaso é a vontade (directa) de Deus”.

Ou seja: “vontade de Deus”, em termos gerais, é tudo o que existe; mas nem tudo é vontade directa de Deus. Deus dá um espaço para a causalidade das leis da natureza macroscópica e para a liberdade da consciência.

Aristóteles define o “acaso” como “uma causa acidental de efeitos acessórios revestindo a aparência de finalidade”; isto é, uma caricatura do determinismo, análogo ao fatalismo popular (“aconteceu porque tinha que acontecer”).

No século XIX, Cournot (salvo seja) formalizou a teoria das séries paralelas (independentes na ordem da causalidade) cujo encontro produz o “acaso”, ou o “azar”: um homem passa por uma ponte e esta desmorona-se: há o encontro entre uma causalidade (a intenção do homem) e outra causalidade (a degradação material da ponte).

Porém, a realidade é mais complexa. Do ponto vista da física, a realidade é muito resistente à análise.

Einstein passou a vida adulta a insurgir-se contra a ideia segundo a qual pudesse existir na Natureza algo que acontecesse sem causa (por acaso). “Deus não lança os dados”, dizia ele. A ideia de uma probabilidade de processo puramente estatística era-lhe completamente estranha. Segundo Einstein, deveria haver uma causa para o comportamento de cada átomo. Einstein estava errado. A verdade é que, por exemplo, é possível prever que uma metade de uma grama de urânio se decompõe em 4,5 milhões de anos, mas não é possível dizer quando é que um átomo concreto de urânio se decompõe: pode decompor-se imediatamente ou apenas daqui a muitos milhões de anos.

A opinião quase unânime (com excepção, por exemplo, de David Bohm) dos físicos modernos e contemporâneos é a de que “Deus lança mesmo os dados”. Fazem a distinção entre causalidade, casualidade e a-causalidade. A casualidade e a a-causalidade não são expressão dos nossos conhecimentos limitados, mas antes são constitutivas do domínio da realidade. Ou seja, existe uma probabilidade objectiva, em contraponto a uma probabilidade subjectiva que se baseie apenas em uma falta de conhecimento das razões causais. Heisenberg escreveu: “A física quântica forneceu a refutação definitiva do princípio de causalidade”.

Mas não podemos atribuir o “acaso” exclusivamente à vontade directa de Deus, porque isso seria desvalorizar a consciência (criada). Não podemos separar a matéria, por um lado, da pessoa (da consciência) ou do modo (livre) como a pessoa observa, por outro lado. Temos aqui, portanto, a matéria enquanto sujeita às leis da natureza macroscópica (sujeita à entropia da gravidade), por um lado, e por outro lado a consciência que observa livre e subjectivamente a matéria, influenciando também as “relações de possibilidades de acontecimentos” sem uma causa definível pela física clássica. É neste sentido que podemos dizer que “o Homem foi criado à imagem de Deus”.

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