segunda-feira, 16 de maio de 2016

O David Marçal, a mecânica de Newton e a astrologia

 

O David Marçal utiliza aqui a lei gravitacional de Newton para refutar a publicação astrológica nos jornais. Eu estou de acordo com ele no sentido em que a “astrologia das massas”, publicada nos jornais, não faz qualquer sentido — embora exista um denominador comum mínimo inerente a cada nativo de um determinado signo astrológico. Mas quando o David Marçal utiliza o argumento da lei gravitacional de Newton contra a astrologia em geral, faz tábua rasa dos conceitos mais actuais da física.

“De todas as implausibilidades, a menos implausível é a gravidade. Mas a força gravítica é proporcional à massa dos corpos (o Sol é gigante e determina o movimento dos planetas no sistema solar) mas diminui com o quadrado da distância. Assim, a força gravítica que o corpo do obstetra exerce sobre o bebé no momento do nascimento é mais forte do que a exercida por Marte ou por qualquer outro planeta (à excepção da Terra). Como afirmou o astrónomo e divulgador de ciência Carl Sagan: «Marte tem muito mais massa, mas o obstetra está muito mais próximo.» E mesmo que houvesse uma qualquer influência da posição dos astros durante o nascimento, ficaria por demonstrar que isso seria determinante para o resto da vida”.

A lei gravitacional de Newton ainda é utilizada em termos práticos; mas em Newton ainda não existia a noção de “campo”. Einstein demonstrou que os campos electromagnéticos são entidades físicas por si próprias, que podem viajar pelo “espaço vazio” e que não podem ser explicadas mecanicamente.

Tudo começou em Maxwell e Faraday. Em vez de interpretar a interacção entre carga positiva e carga negativa, dizendo simplesmente que as duas cargas se atraem como duas massas na mecânica newtoniana, Maxwell e Faraday acharam mais apropriado dizer que cada carga cria uma “perturbação”, ou uma “condição” no espaço em redor, de modo que a outra carga, quando está presente, sinta compulsão. Esta condição no espaço, que tem a potencialidade de produzir uma compulsão, foi por eles chamada de “campo”: é criado por uma única carga, e existe independentemente da outra carga estar presente para sentir o seu efeito.

Na perspectiva newtoniana (que o David Marçal adopta para criticar a astrologia entendida em si mesma, e não só a astrologia das massas publicada pelos me®dia), as “forças” estavam rigidamente ligadas aos corpos em que actuavam. Com o conceito de “campo”, o conceito de “força” foi substituído pelo conceito mais subtil de um “campo” que tinha a sua realidade própria, e podia ser estudado sem qualquer referência aos corpos materiais.

Hoje sabemos que a massa de corpo nada mais é do que uma forma de energia (teoria restrita de Einstein). Mesmo um corpo em descanso tem energia armazenada na sua massa, e a relação entre as duas é dada pela equação E=mc^2. A força da gravidade (teoria geral de Einstein) tem o efeito de curvar o espaço e o tempo; isto significa que a geometria euclidiana comum deixa de ser válida num espaço curvo. O espaço tridimensional é realmente curvo, e a curvatura é causada pelo campo gravitacional dos corpos maciços. Onde quer que haja um objecto maciço, por exemplo, uma estrela ou um planeta, o espaço que os rodeia é curvo, e o grau de curvatura depende da massa do objecto. E como o espaço nunca pode ser separado do tempo, também o tempo é afectado pela presença da matéria, fluindo diversamente por partes diferentes do universo. É de notar que a noção de “espaço vazio” é hoje obsoleta.

Ora, há que convir que a curvatura do espaço-tempo causada pela massa do médico obstetra não é da mesma grandeza da que é causada pela massa do Sol. Ou seja: a distância entre corpos é importante para a astrologia e para a Física, mas não é o mais importante.

Referi-me aqui apenas à relatividade de Einstein, ou seja, não entrei na quântica — porque, do ponto de vista da física quântica, o argumento do David Marçal é ainda mais absurdo. O David Marçal tem que escolher entre a filosofia da ciência ou a bioquímica: se optar pela primeira, não pode utilizar argumentos desse calibre. E se optar pela bioquímica estará no seu ambiente mais cómodo, evitando escrever asneiras.

Note-se que este verbete ataca o argumento do David Marçal (Reductio ad absurdum), mas não defende a astrologia como ciência positivista. Mas repare-se neste trecho do David Marçal:

“E mesmo que houvesse uma qualquer influência da posição dos astros durante o nascimento, ficaria por demonstrar que isso seria determinante para o resto da vida”.

O David Marçal pensa que a astrologia defende que a “influência da posição dos astros no momento do nascimento”, segundo astrologia, é determinante para o resto da vida”. Mas nenhum astrólogo sério e reputado defende esta noção expressa pelo David Marçal: a única astrologia que o David Marçal conhece é a que vem publicada nos me®dia; e, no entanto, o David Marçal não se coíbe de ter opinião sobre aquilo que não sabe.

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