sábado, 25 de janeiro de 2014

A pobreza da Ética de Karl Popper

 

“Antes de mais, uma observação sobre a ambiguidade da palavra “sentido” na expressão “sentido da vida”. Esta expressão é usada muitas vezes como se com ela se pretendesse falar de um sentido interior oculto, um pouco como se pode falar do sentido oculto de um anagrama ou de um epigrama ou do sentido do Chorus Mysticus no Fausto de Goethe.

Porém, a filosofia dos poetas e dos filósofos ensinou-nos que a expressão “o sentido da vida” deve ser entendida de outro modo: que o sentido da vida não é algo de oculto, que podemos encontrar ou descobrir na própria vida, mas algo a nós próprios podemos dar à nossa vida. Podemos conferir um sentido à nossa vida através das nossas acções, do nosso comportamento, da nossa atitude perante a vida, perante os outros e perante o mundo.”

— Karl Popper, trecho da conferência proferida na Rádio da Baviera em 1961 (Der Sinn der Geschichte, Munique, 1974)

Em primeiro lugar, convém dizer que os poetas, enquanto tal, não são filósofos. Por exemplo, Fernando Pessoa foi filósofo mas não enquanto poeta: ora foi uma coisa, ora foi outra, mas não ao mesmo tempo — porque a poesia é filosofia sem a Lógica. Ou seja, se retirarmos a lógica à filosofia, temos poesia.

Karl Popper foi muito fraco em ética; muito fraco, mesmo! Não é exagero meu. Em metafísica também não foi grande coisa. Na História das Ideias foi sofrível. A única área em Karl Popper se afirmou de facto, e até não lhe foi reconhecido devidamente o mérito, foi em epistemologia (no sentido europeu continental de “história da ciência”).

Karl Popper, no trecho citado, atribui o sentido da vida à acção, tomando o efeito pela causa: segundo ele, não precisamos de descobrir o sentido da vida para depois agir em conformidade com essa descoberta: pelo contrário, agimos, primeiro e antes de mais nada, para podermos depois, e em função da acção, dar sentido à vida. Esta visão do “sentido da vida” está muito próxima do Pragmatismo americano de princípios do século XX.

Seria como se nós disséssemos que “a visão dá sentido ao olho”, em vez de dizer que “o olho dá sentido à visão”. Ou que disséssemos que “o andar dá sentido à perna”, em vez de dizer que “a perna dá sentido ao andar”. Karl Popper inverte o nexo causal entre o “sentido” e a “acção”. Para ele, é a acção que define o sentido da vida (o que é uma impossibilidade), e não o sentido da vida que define a acção (como seria lógico).

Aquilo que um qualquer ser humano deseja, não é ser feliz, mas antes é uma razão para (tentar) ser feliz. E essa razão para (tentar) ser feliz não depende da acção, mas cada um tem que descobri-la antes da acção: é a própria razão para ser feliz — o sentido da vida — que determina depois a acção.

Aquilo que preenche o ser humano (que não seja neurótico) não é a vontade de Poder nem a vontade de prazer, mas antes é a vontade de sentido, porque esta oferece uma razão para o Poder e para o prazer. Em um ser humano normal, o Poder e o prazer são efeitos secundários do sentido realizado. Porém, se o prazer se torna no objectivo primeiro de uma intenção, como acontece com o neurótico, o ser humano perde de vista a razão do prazer, e o efeito “prazer” deixa de fazer sentido.

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