terça-feira, 5 de agosto de 2014

O António Piedade, o neocórtex humano, os macacos e as relações sociais

 

“Há investigações sociais e biológicas que mostram haver um limite superior para o número de indivíduos com os quais conseguimos manter relações sociais frequentes e estáveis. Nos anos 90 do século passado, o cientista R.I.M Dunbar publicou uma série de artigos em que relacionava o número de indivíduos nos grupos sociais de espécies primatas (incluindo a nossa) com o tamanho do neocortex cerebral. E Dunbar chegou à conclusão de que cada um de nós não consegue gerir, em média, mais de 150 relações individuais. Há como que um limite da capacidade cognitiva de que dispomos para manter estáveis as nossas relações pessoais. Acima desse limite deixamos de conseguir sociabilizar. Esse limite, ou esse número, é desde então conhecido por número de Dunbar.”

O TAMANHO DAS NOSSAS REDES SOCIAIS

Quando eu li a comparação que o António Piedade faz entre o ser humano e o macaco, por um momento quase acreditei nele.

Seguindo o raciocínio do António Piedade, o homem de Neanderthal — que tinha um neocórtex maior do que o homo sapiens — teria uma capacidade cognitiva maior do que o homo sapiens sapiens. E já não falo em outros mamíferos, como por exemplo, a baleia, que tem um neocórtex muitíssimo maior do que o ser humano.

As abelhas, que têm apenas 960 mil neurónios em todo o sistema nervoso (quando o ser humano tem cerca de 23 mil milhões de neurónios apenas no córtex cerebral), têm uma capacidade de relacionamento social muitíssimo superior à dos humanos, criando relacionamentos fortes na colmeia que seriam impossíveis na sociedade humana. Ou seja, qualquer ligação de causa/efeito entre o tamanho do neocórtex, ou do número de neurónios do neocórtex, por um lado, e a capacidade de relacionamento dentro da mesma espécie, por outro lado, é simplificadora.

Por exemplo, o chimpanzé tem cerca de 6 mil milhões de neurónios no córtex cerebral, ao passo que o elefante tem 11 mil milhões de neurónios no córtex cerebral. Ora — como dizem os darwinistas — se “o chimpanzé está mais perto do homem”, na realidade a quantidade de neurónios do elefante aproxima-se mais da quantidade de neurónios do ser humano, e em comparação com o chimpanzé.


Este tipo de raciocínio simplificador (a do António Piedade) é típica do cientismo  e do blogue Rerum Natura. Cuidado!, porque essa gente tem opinião!: eles enganam facilmente os ignaros, e sentem-se felizes por os enganar. Gostam de enganar o povo, e em nome da “ciência”.

Eles fazem de conta de que o ser humano não é um sujeito, quando comparam o córtex do ser humano com o córtex de um macaco. A ideia deles é a de criar uma elite que sabe que é uma espécie de macaco através do conhecimento (gnosticismo), elite essa que se distingue dos ignorantes que não têm consciência de que são uma espécie de macacos. Ou seja, segundo o raciocínio do António Piedade, há duas categorias de seres humanos: os que sabem que são macacos (a elite cientificista e darwinista), e os que não sabem que são macacos (os seres humanos em geral e os símios); e apenas os da primeira categoria serão “salvos mediante o conhecimento”: são os Pneumáticos actuais.


Por fim: o António Piedade confunde os “relacionamentos fortes”, por um lado, com os “relacionamentos fracos” — sendo que, estes últimos, apenas o ser humano é capaz de elaborar. Ou seja, confunde “comunidade”, por um lado, e “rede social”, por outro lado. Na comunidade, os laços sociais são fortes; na rede social, predominam os “relacionamentos fracos”.

Os “relacionamentos fracos” permitem ao ser humano lidar com milhares de pessoas, dependendo das circunstâncias e da situação particulares em que ele (ser humano) se encontra a cada momento.

E quando eu vejo o blogue Rerum Natura — a que pertence o Carlos Fiolhais que tanto reclama contra o governo por causa dos “cortes na ciência” — defender posições destas, começo a dar razão a Passos Coelho quando quer acabar com aquela macacada toda.

4 comentários:

  1. Não li o texto original a que se refere, nem vou defender o que foi dito originalmente, mas toda a sua conversa sobre números absolutos de neurónios para denegrir a ciência parece abusiva por parte do Orlando. Sugiro-lhe uma palestra chamada "What is so special about the human brain?" da neurocientista Suzana Herculano-Houzel (sei que o Orlando detesta neurocientistas, mas fica a sugestão à mesma). Cumprimentos.

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    1. 1/ Os números a que me referi podem ser encontrados na Internet em sites científicos, e já fazem parte do senso comum.

      2/ Quem “denigre a ciência” é gente como você e o António Piedade que se servem a ciência para fins ideológico-políticos. Chama-se a isso “cientismo”.

      3/ Agradeço a recomendação, mas eu gosto de factos científicos, e não de retórica cientificista.

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  2. Lamento que pense assim, e que assuma que eu tenho "fins ideológico-políticos" baseado na sugestão duma palestra que nem sequer se deu ao trabalho de ver. Eu até gosto de ler alguns do seus raciocínios, mas quando o Orlando se recusa a rever e questionar o que pensa, não há nada que eu possa fazer. Cumprimentos.

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  3. Se você diz que não leu o texto original, e apesar da minha citação do texto original, então você procede em retórica em vez de utilizar factos.

    Eu vou repetir: os números que eu citei não foram inventados por mim: existem disponíveis para consulta em vários sites científicos.

    Se você quer discutir um qualquer assunto comigo, não se esconda por detrás de uma qualquer autoridade de direito. Você incorre em uma falácia lógica conhecida por “falácia ad Verecundiam”.

    Diga o que pensa sem me dar conselhos de leitura, porque eu também não lhe dou conselhos de leitura. Cada um sabe de si, e Deus sabe de todos.

    Por fim: repito: qualquer invocação de um nexo causal entre o tamanho do neocórtex, ou do número de neurónios do neocórtex, por um lado, e a capacidade de relacionamento dentro da mesma espécie, por outro lado, é simplificadora.

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