sábado, 17 de janeiro de 2015

O raciovitalismo de Ortega y Gasset


 

“A vida é o que acontece quando fazíamos outros planos” — John Lennon

Com esta frase, John Lennon coloca o raciovitalismo de Ortega y Gasset na gaveta.

É claro que devemos fazer planos, mas devemos saber de antemão que os planos são feitos para falharem. Mas isso não significa que, se não fizermos planos — se não soubermos o que queremos fazer com aquilo que nos rodeia — então as coisas correm sempre e necessariamente contra nós. Embora seja melhor fazermos planos — por uma questão de bom-senso e prudência —, nada nos garante que a ausência de planos, em uma determinado domínio da nossa vida, seja necessariamente negativa para a nossa existência.

Por exemplo, se não jogarmos na lotaria, é verdade que não ganhamos prémio. Mas há muita gente que passa a vida inteira a jogar na lotaria e não ganha nada ou quase nada; e outros que ganharam o prémio e cujas vidas se tornaram mais infelizes e angustiadas do que eram antes do sortilégio. Portanto, a acção ajuda mas não define a realidade: é a acção que decorre da consciência que pode definir, mais ou menos (dependendo dos casos), a (nossa) realidade.

A a-causalidade descoberta pela física quântica vai contra o raciovitalismo de Ortega y Gasset.

Jose_Ortega_y_GassetÉ que, ao contrário do que pensava Ortega y Gasset, as coisas têm um ser em si: e é claro que as coisas podem ser influenciadas (ou mesmo determinadas) pela consciência que comanda a acção, e não — como julgava Ortega y Gasset — pela acção que comanda a consciência. A verdade é que o homem age porque é livre, e não é livre porque age (os cães, por exemplo, são livres porque agem; mas eu não sou cão: ajo porque sou livre).

O raciovitalismo de Ortega y Gasset faz a síntese entre o idealismo alemão, o neocriticismo alemão, o pragmatismo americano, e o resultado é uma espécie de Existencialismo não-determinista que decorre de uma espécie de filosofia de acção.

O facto de “o meu saber” ser subjectivo, não significa que o Saber (com maiúscula) seja subjectivo — como defende Ortega y Gasset; porque se o Saber é subjectivo, então a Verdade (com maiúscula)  não existe, e a ciência, por exemplo, e as religiões também, não fazem qualquer sentido.

O facto de “a realidade aparecer ao homem dividida em perspectivas que são tantas quantos os indivíduos” (outro postulado de Ortega y Gasset), não significa que as coisas não tenham uma realidade em si, por um lado, nem significa que existam tantas “verdades” quantos os indivíduos, por outro  lado.

O facto de “a realidade aparecer ao homem dividida em perspectivas que são tantas quantos os indivíduos” apenas significa que existem indivíduos à procura da Verdade: cada indivíduo é apenas uma parte objectiva de um todo objectivo. A subjectividade de cada parte (de cada indivíduo) é apenas a sua contribuição objectiva para a descoberta — e não “construção”, como diz Ortega y Gasset — da Verdade Objectiva.

O homem não constrói nada que não seja a priori passível de ser construído através da descoberta da realidade e dos seus valores.

A Teoria Finística do Conhecimento, do biofísico alemão Alfred Gierer, destrói qualquer ideia segundo a qual “o homem cria coisas através da acção”. O homem apenas descobre coisas que sempre existiram enquanto previamente criadas.

Há outros aspectos do pensamento de Ortega y Gasset com que concordo, mas não com o raciovitalismo.

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