“O pensamento que se quer sempre justo, paralisa-se. O pensamento progride quando caminha entre injustiças simétricas, como entre duas filas de enforcados”. → Nicolás Gómez Dávila
O senhor Silva “voltou à carga” escrevendo acerca do “preconceito” (ver verbete anterior sobre este assunto).
“Ainda há dias o meu filho me acusou de preconceito, e com razão. Deu a notícia de que 2 enfermeiros e um polícia tinham sido agredidos no H S João por 4 acompanhantes de 1 doente. E saiu-me: são ciganos de certeza. E levei um sermão. A verdade é que veio a saber-se que eram. A minha associação foi por experiência (infelizmente muita) das urgências dos hospitais”.
Aquilo a que o senhor Silva chama de “associação por experiência”, chama-se “indução” e é a base da ciência. E, se seguirmos à risca o fio de raciocínio do senhor Silva, concluímos que a ciência é feita de preconceitos — o que é verdade; mas são preconceitos baseados em factos objectivos.
O senhor Silva não assistiu (pessoalmente) ao referido desacato do hospital de S. João; mas concluiu por inferência baseada na indução.
Chama-se “indução” ao argumento em que, se as premissas forem verdadeiras, isto é, tiverem valor lógico de verdade, a conclusão não é necessariamente verdadeira, mas apenas provavelmente verdadeira — é a inferência conjectural ou não-demonstrativa; é o raciocínio que obtém leis gerais a partir de casos particulares. As conclusões de um raciocínio indutivo não são logicamente necessárias: a indução opõe-se, neste aspecto, à dedução.
Portanto, quando o senhor Silva diz que “o preconceito é um sentimento nocivo”, ele está errado — porque 1/ o preconceito pode não ser um “sentimento”, mas antes o resultado de uma constatação racional de um facto; e 2/ também porque o preconceito pode não ser nocivo se ajudar o ser humano (ou a sociedade) a sobreviver.
Por outro lado, o senhor Silva parece seguir os conselhos do papa Chiquinho que diz que não devemos julgar ninguém (“¿Quem sou eu para julgar?!” — perguntou, certa vez, o Chico).
“É nesta duplicidade que consiste a realidade do preconceito que, por muito que o deseje, jamais o ser Humano se conseguirá libertar, e continuará eternamente, sob sujeição da inconsciência, “o rôto a julgar o esfarrapado”; não porque não lhe assista a razão no instante, mas porque não pausou para olhar o seu interior; quando não, não ajuizaria.”
Mas (por exemplo) quando Jesus Cristo chamou à atenção do óbulo da viúva, criticou os poderosos que não davam aos pobres relativamente tanto quanto ela deu (Marcos 12:41-44); ou seja, Jesus Cristo fez um juízo-de-valor quando comparou a pobre dádiva da viúva com a ganância dos poderosos. Jesus Cristo julgou. E Ele julgou também quando protegeu a adúltera da lapidação: julgou a impiedade dos que se preparavam para a apedrejar.
Há outros exemplos de juízos-de-valor feitos por Jesus Cristo, como o da crítica aos fariseus (Mateus 23:27-32). Portanto, não é verdade que seja correcto abstermo-nos de quaisquer juízos-de-valor; o papa Chico e o senhor Silva estão, por isso, errados.
O que temos que fazer é basear os nossos juízos-de-valor (os nossos preconceitos) em factos objectivos — e não em meros sentimentos, como acontece actualmente: a irracionalidade voltou a estar na moda.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Neste blogue não são permitidos comentários anónimos.