A diferença entre a doutrina social da Igreja Católica (DSIC) , por um lado, e a sua adopção ideológica por parte de um partido democrata-cristão, é a de que a DSIC não é imposta à sociedade pela Igreja Católica: adere a ela quem quer — ao passo que a lógica partidária é a de imposição ideológica do seu ideário logo que chegue ao Poder.
Um partido democrata-cristão é aquele que tem como base do seu ideário político a doutrina social da Igreja Católica que, por usa vez, ainda hoje mantém válida a encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII. Sendo assim, o CDS/PP não é um partido democrata-cristão; aliás, nos seus estatutos fala-se apenas em “inspiração cristã”. E assim como Mário Soares meteu um dia o marxismo na gaveta, Paulo Portas meteu a inspiração cristã noutro sítio qualquer: basta que Adolfo Mesquita Nunes seja o benjamim e um protegido de Paulo Portas, para que o CDS/PP seja um partido tão neoliberal quanto o Partido Social Democrata de Passos Coelho.
Perguntar-me-ão: ¿existem militantes ou simpatizantes do CDS/PP que sejam católicos confessos? Claro que existem, assim como existem católicos que votam no Partido Socialista, e mesmo católicos alentejanos que votam no Partido Comunista. E isto significa uma coisa muito simples: não existe, em Portugal, um partido democrata-cristão propriamente dito. Ponto final.
Portanto, este texto parte de um princípio errado: o de que o CDS/PP é um partido democrata-cristão. Nem sequer podemos dizer que o Partido Popular espanhol, de Rajoy, seja democrata-cristão. Na União Europeia já não existem partidos democrata-cristãos, com excepção de alguns países que ainda estão fora do Euro, como por exemplo na Hungria.
O que eu não consigo perceber é como se defende que o “combate à partidocracia” deve ser realizado através da imposição de um partido único — o tal “partido tradicionalista”, que teria, então, o monopólio da partidocracia. Digamos que a partidocracia seria reduzida a um só partido e sem possibilidade de contraditório político.
Em contraponto, eu defendo que devem existir na nossa sociedade alguns mecanismos de democracia directa, para que o povo assuma as suas responsabilidades e não esteja sempre a atirar as culpas para os outros — para os partidos e para a classe política. E defendo que os políticos devem ser responsabilizados criminalmente em caso de gestão danosa da coisa pública — por exemplo, José Sócrates deveria ter sido julgado em tribunal.
Portanto, a forma de combater a partidocracia é retirar poder aos partidos através de alguns mecanismos de democracia directa, e não conceder a um só Partido Tradicionalista o poder absoluto.