terça-feira, 4 de março de 2014

A Rússia não é a URSS (times they are a changin')

 

Uma das características de qualquer ideologia para-totalitária é a necessidade premente de diabolização de um inimigo externo.

Por exemplo, na URSS (ou na actual Coreia do Norte), qualquer deficiência do regime político, qualquer crítica ao sistema soviético era imediatamente denunciada como conspiração anti-comunista que se reforça à medida que o inimigo se vai enfraquecendo (?!); mas, por outro lado, esse inimigo nunca se enfraqueceria se se reforçasse...!

Hoje, os Estados Unidos de Obama necessitam de um inimigo externo, e passaram a diabolizar a Rússia (sondagens recentes revelam que 60% dos americanos não estão satisfeitos com Obama).

A lógica da política externa dos Estados Unidos é, na sua essência, maniqueísta (à semelhança do que aconteceu com o Estalinismo): criação de um inimigo externo, diabolização do inimigo, e a ideia de que a Rússia se reforça porque está já no seu estertor — falando português: segundo os Estados Unidos, a Rússia, alegadamente, está a dar o “peido-mestre”, e por isso é que está mais forte (a mesmo padrão estalinista de “inimigo externo”).

Segundo este raciocínio e discurso de Obama, “a Rússia está do lado errado da História”, ou seja, vemos aqui uma concepção simplista e unilateral de “progresso”, uma visão exclusivista e ocidentalizada da História (à boa maneira do idealismo alemão que descambou no materialismo dialéctico de Karl Marx).

Os “ventos da História” não são aqueles que criam um incêndio que a Rússia não ateou.

O único país do mundo que tem o direito de invadir outro país sem qualquer mandato da ONU, é os Estados Unidos.

A propaganda dos Estados Unidos é a de que “a Rússia de hoje é a mesma coisa que a URSS”. E os me®dia compram alegremente esta tese americana que faz com que o conservadorismo ocidental se torne obamista. No entanto, foram os Estados Unidos que entraram no Iraque sem mandato da ONU. Ou seja, o único país do mundo que tem o direito de invadir outro país sem qualquer mandato da ONU, é os Estados Unidos. E se a Rússia pretende proteger os seus interesses seculares na península da Crimeia, os Estados Unidos vêm a terreiro diabolizar a Rússia, dizendo que esta está do lado errado da História, que não tem o direito de invadir a península (mesmo que não exista ainda propriamente uma invasão!) porque esse direito de invasão de outros países, alegadamente, está reservado aos Estados Unidos.

O que é espantoso é este simplismo, patrocinado pela propaganda americana obamista: a ideia segundo a qual a defesa dos interesses da Rússia tem origem nas teorias de Aleksandr Dugin!, quando, por exemplo, é a extrema-direita ucraniana que defende uma política de animosidade e de conflito em relação à Rússia. Ou seja, o mundo é visto ao contrário em nome de um pan-americanismo. Vemos aqui os fundamentos ideológicos da necessidade do inimigo externo para fazer esquecer a política americana de ataque aos valores da civilização cristã — a promoção cultural do aborto, o "casamento" gay, a adopção de crianças por pares de invertidos, a procriação medicamente assistida indiscriminada, as "barriga de aluguer" como negócio e o tráfico de crianças, o eugenismo, etc.., ou seja, tudo aquilo que a actual Rússia combate através de uma aliança com a Igreja Ortodoxa Russa.

Em suma, quando a coerência política dos Estados Unidos está em causa (ou quando a ambiguidade dos Estados Unidos é exposta), o conservadorismo manda a ética às malvas e segue caninamente Obama! Se é certo que a ambiguidade existe em política, qualquer análise política que não recuse essa ambiguidade, e que não afirme um princípio desambiguizante, não pode ser levada a sério.

Este tipo de propaganda americana, fede.

As primaveras árabes, financiadas e apoiadas pelos Estados Unidos, resultaram em regimes fundamentalistas islâmicos e até no reforço da Al Qaeda nesses novos regimes. Não há aqui nenhum Direito Internacional nem há ética política. Desta vez, os Estados Unidos transformaram a Ucrânia em um país compósito e em um equilíbrio precário; e os “conservadores obamistas” batem palmas.

8 comentários:

  1. É verdade que os EUA não têm moral para criticar a Rússia nesta questão.
    Mas a Rússia tem de ser olhada com muita desconfiança. É claramente o lobo vestido de carneiro.

    "ou seja, tudo aquilo que a actual Rússia combate através de uma aliança com a Igreja Ortodoxa Russa"

    Esta aliança é pura fachada e maliciosa. Acreditar nesta falsa viragem da Rússia para o cristianismo é precisamente o que Putin, agente da KGB, quer. As palavras de Nossa Senhora não podem ser esquecidas. A Rússia é a principal fonte do mal.

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  2. 1/ Em qualquer análise (política, filosófica, etc.), não devemos atribuir subjectivamente intenções a alguém, ou seja, devemos atermo-nos a factos. Normalmente, quem atribui a outrem intenções sem prova de facto é o movimento revolucionário.

    Eu não devo dizer que “essa aliança é maliciosa” sem factos que o demonstrem. Essa atitude é típica do Bloco de Esquerda ou do Partido Comunista. Por que é que essa aliança é maliciosa? Resposta: “Porque sim!, porque eu, Vasco, quero que assim seja! Ponto final! E não se fala mais disso!”

    A ler:

    http://wp.me/p1H4zR-niA

    2/ Nossa Senhora falou da conversão da Rússia no sentido do regime comunista que não permitia a prática da religião. Hoje, o povo russo já é muito mais religioso do que o povo americano, e esta diferença entre os dois povos tende a aumentar.

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  3. 1) Eu falei assim porque pensei que estivesse por dentro dos factos e eu não tivesse que os mostrar. Quando temos um regime que é controlado pela mão autoritária de um "ex"-agente da KGB e que se mantém no poder ao estilo ditatorial rodando no cargo com o seu carrasco. E que a sociedade russa embora com algumas melhorias tem exemplos destes:
    - Número de abortos aproxima-se do de nascimentos - http://www.jn.pt/PaginaInicial/Mundo/Interior.aspx?content_id=1473574
    - Um quinto da população russa morre por consumo excessivo de alcool - http://darussia.blogspot.pt/2011/02/um-quinto-dos-russos-morrem-devido.html
    Penso ser uma amostra suficiente para a minha acusação.

    2) As palavras de Nossa Senhora:
    " ... virei pedir a consagração da Rússia a meu Imaculado Coração e a Comunhão Reparadora nos Primeiros Sábados. Se atenderem a meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz, se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja, os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas, por fim o meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia, que se converterá, e será concedido ao mundo algum tempo de paz.”

    Nossa Senhora não faz qualquer referência ao regime comunista. É óbvio que o regime comunista está incluído mas não é o todo mas apenas a parte. A consagração da Rússia ainda não foi feita e por isso ainda não se deu a conversão.

    PS: A palavra divina de Nossa Senhora vale mais que todos os factos. Enquanto a consagração não for feita como Nossa Senhora pediu eu olharei sempre com desconfiança para as acções da Rússia.

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    1. 1/ Quer você goste, ou não, parece-me que Putin foi eleito. Parece-me — digo eu! Mas como você sabe mais do que eu, agradecia que me confirmasse esse facto: ¿será que Putin foi eleito? É que ando meio confuso com os factos que você aponta...!

      2/ O facto de Putin ter sido agente do KGB (como milhões de outros russos foram agentes do KGB), isso não significa que o KGB exista. ¿Será que o KGB existe e eu não me dei conta desse facto?!

      Dou um exemplo: pelo facto de o pai de Angela Merkel ter sido oficial nazi, isso não significa que o partido nazi exista na Alemanha, nem significa que Angela Merkel seja nazi.

      Dou outro exemplo: pelo facto do professor Ariano Moreira ter sido ministro de um governo de Salazar, isso não significa que o Estado Novo ainda exista, nem significa que ele seja (hoje) Salazarista.

      Portanto, parece-me que o KGB não existe. Parece-me — digo eu! Posso estar enganado! Mas como você conhece os factos, e tem certezas e eu não, agradeço que me demonstre que o KGB existe.

      3/ Os factos que você apontou acerca do aborto são (obviamente) sequelas da URSS. Porém, Putin já mudou alguma coisa: enquanto que nos Estados Unidos os abortos são permitidos até quase à data de nascimento, o aborto na Rússia só é permitido (agora) até às 12 semanas. Isto são informações que eu tenho, mas se calhar, as minhas informações estão erradas e você é que está certo:

      http://reut.rs/1lyM8Jw

      http://goo.gl/stxlY

      Por outro lado, não sei o que é melhor: drogas a céu aberto, ou álcool. Parece que você pensa que as drogas são fixes porque os americanos consomem muita droga (cocaína, heroína, etc.), mas pensa que o álcool é muito mau porque os russos consomem muito álcool.

      Ou seja: tudo o que os americanos consomem é porreiro, e tudo o que os russos consomem é uma merda! É um ponto de vista que eu respeito. Mas isto é só a minha opinião: se calhar estou errado, e consumir cocaína ou heroína em barda é melhor do que consumir álcool.

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  4. Antes de mais não tenho referido os EUA nos meus comentários como exemplo de nada.

    O regime nazi e suas instituições foram erradicadas da Alemanha no pós guerra, tendo sido os seus membros julgados pelos crimes cometidos contra a humanidade. Já não se pode dizer o mesmo no pós união soviética cujo regime em termos de crimes contra a humanidade pôs o regime nazi a um cantinho. Ou seja as pessoas por detrás de tão hediondo regime permaneceram impunes, sendo pútin dessa turma.
    O Estado Novo não tem relação com regimes tão grotescos como estes.

    A Rússia não é propriamente bem comportada em relação às drogas:
    http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_countries_by_prevalence_of_opiates_use

    "tudo o que os americanos consomem é porreiro, e tudo o que os russos consomem é uma merda! É um ponto de vista que eu respeito"
    Esse ponto de vista é de quem? Meu não é com certeza.

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    1. 1/

      “Antes de mais não tenho referido os EUA nos meus comentários como exemplo de nada.”

      Falácia lógica conhecida por Audiatur Et Altera Pars:

      http://sofos.wikidot.com/audiatur-et-altera-pars

      Só se pode dizer que “uma coisa é má” se fizermos uma comparação com uma “outra coisa que é melhor” — por exemplo, uma comparação com a ideia de Bem Absoluto. Fazer uma crítica à Rússia sem um paradigma ou uma bitola que nos permita fazer um juízo de valor, é absurdo.

      Por exemplo: se eu digo que “um aluno merece 10 valores”, tenho que dizer qual é a escala de valorização: ¿será de 0 a 20? será de 0 a 10? Dizer apenas que “o aluno merece 10 valores”, sem definir previamente a escala de valores que me permita fazer um juízo de valores, é um absurdo.

      De forma semelhante, não é possível criticar a Rússia sem ter como comparação outros países. E como, neste caso concreto da Ucrânia, estão envolvidos os Estados Unidos, é óbvio e evidente que a comparação com os Estados Unidos não só está implícita como é lógica.

      2/

      “O regime nazi e suas instituições foram erradicadas da Alemanha no pós guerra, tendo sido os seus membros julgados pelos crimes cometidos contra a humanidade.”

      No julgamento de Nuremberga foram julgadas 23 pessoas. Portanto, podemos concluir (segundo o seu raciocínio) que os nazis alemães eram apenas 23 pessoas...!

      http://goo.gl/Qhi1C

      Cientistas nazis, como por exemplo, Von Braun ( http://goo.gl/hJ1pNC ) foram trabalhar para o programa espacial dos Estados Unidos. Ou seja, quando os criminosos servem os interesses dos Estados Unidos, então não são criminosos!

      3/

      Com o Estado Novo e com Adriano Moreira, fiz uma analogia, e não uma comparação.

      http://sofos.wikidot.com/analogia

      4/

      Concluo que “se a Rússia não é propriamente bem comportada em relação às drogas”, então não devemos comparar a Rússia com mais nenhum país, para que possamos apenas condenar a Rússia. O que interessa é condenar a Rússia e branquear os outros países. Brilhante!



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  5. Eu não acho os EUA um bom exemplo. Embora grande parte da sua população seja cristã conservadora, esta não se reflecte na sua política.
    A única referencia que eu fiz aos EUA foi que nesta situação em particular eles não têm autoridade moral.

    Eu não tenho apenas dois modelos Rússia vs. EUA em que tenho de optar por um. Seria como ter de escolher entre dois pedaços de estrume para comer. Mesmo que só houvesse dois pedaços de estrume eu conseguiria dizer que os dois são maus e que não quero nenhum.

    Eu penso que a minha mensagem ficou clara. A viragem da Rússia tem de ser olhada com muita desconfiança. Eles são os mestres da mentira (a história prova isto) e se a Rússia tomar a dianteira como potência mundial não sei se será boa coisa, mais uma vez relembro as palavras de Nossa Senhora.

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    1. Caro amigo:

      Ao analisar este problema, não podemos partir do princípio de que há aqui “uns bons (o chamado “ocidente”) que são contra os maus da fita (os russos)”. Não há aqui inocentes nem virgens ofendidas. O maniqueísmo político é mau conselheiro, para além de ser uma emulação do maniqueísmo revolucionário.

      O problema é outro: é o de saber se, por exemplo, os Estados Unidos têm direito à sua soberania. E tem esse direito. Mas a verdade é que o povo dos Estados Unidos já não é soberano: a oligarquia plutocrática globalista roubou a soberania ao povo americano — com ou sem Obama: Obama é um fantoche.

      E, na mesma medida em que o povo dos Estados Unidos já não controla a sua soberania que está nas mãos de um punhado de plutocratas, o que se pretende agora é controlar a soberania da Rússia. E a submissão da Ucrânia é essencial para que essa alienação da soberania russa seja levada a cabo.

      Portanto, eu não digo que os russos são anjos e que os americanos são demónios. O que eu digo é que a Rússia tem todo o direito a defender a sua soberania.

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