sexta-feira, 20 de junho de 2014

A omnisciência de Deus e a liberdade do ser humano

 

A expressão “futuros contingentes” foi utilizada por Aristóteles e depois adoptada pela Escolástica: o futuro é contingente e imprevisível, segundo Aristóteles. Para Aristóteles não havia uma necessidade de que o futuro acontecesse de uma maneira ou de outra. Já para Leibniz — um pouco na linha de Espinoza — o futuro pode parecer imprevisível para o ser humano, mas não é contingente e antes é determinado e necessário. Esta é, aliás, a visão de Fernando Pessoa acerca do futuro.

Espinoza caiu em uma contradição fatal que o coloca entre os filósofos menores: por um lado, defendeu a liberdade do indivíduo enquanto consciência, mas por outro lado defendeu o determinismo ontológico do ser humano — reduziu ser humano a um fenómeno da natureza, como por exemplo a uma pedra (Espinoza, Carta 58, página 303).

O problema do futuro, da liberdade e do determinismo pode ser visto assim:

Deus conhece todas as possibilidades (de eventos) do futuro (Deus é omnisciente); mas este facto não significa que Deus necessariamente interfira no livre-arbítrio do ser humano e nas escolhas humanas das suas próprias possibilidades de futuro. Deus pode interferir, mas não o faz necessariamente.

Deus sabe que você pode ir “por aqui” ou “por ali” na construção do seu futuro, mas isso não significa que você não tenha liberdade de escolher o caminho por onde ir, nem significa que Deus lhe imponha necessariamente um caminho para o seu futuro. Sublinho aqui a palavra necessariamente.

Quanto você escolhe um caminho ou toma uma decisão, apenas escolhe uma possibilidade já prevista por Deus e que Ele conhece; mas essa possibilidade não lhe é necessariamente imposta por Deus, como pré-determinada. Você é livre de escolher os caminhos para definir o seu futuro: o que pode acontecer é que você não tenha em seu poder a informação necessária e a consciência dos seus actos por forma a construir um futuro menos negativo; e em alguns casos, Deus pode interferir por razões que são Dele e que são, muitas vezes (mas não sempre), ininteligíveis para nós.

Assim reconciliamos a omnisciência de Deus e a liberdade do Homem.

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