“Uma das primeiras grandes verdades que eu aprendi nos EUA foi que não é possível argumentar com o sucesso.
Quando analisamos um caso clínico, por exemplo, que teve um desfecho positivo, apesar dos erros crassos que foram cometidos durante o tratamento, é inútil apontar esses erros porque, em última análise, alguém vai sempre invocar o sucesso do resultado para demonstrar que não houve qualquer erro”.
Temos aqui um juízo que ignora o conceito de juízo universal — o que é característica do politicamente correcto. Dou um exemplo.
Um tio meu fumava dois maços de cigarros por dia e morreu aos noventa e tal anos. Consideramos que a longevidade dele foi um “desfecho positivo”, apesar de ser um fumador inveterado. Portanto, é inútil apontar comportamentos menos correctos (EM GERAL) às pessoas porque, em última análise, alguém vai sempre invocar a longevidade de uma pessoa para demonstrar que não houve qualquer erro de comportamento.
Esta confusão do politicamente correcto da negação do juízo universal em questões de facto começou com Montaigne e atingiu o seu refinamento com o cepticismo de David Hume.
Segundo Hume, negar uma afirmação de origem empírica não é uma auto-contradição, alegadamente porque o estádio dos assuntos descritos poderia ter sido outro.
Por outras palavras: “se a minha avó tivesse rodas era um avião; portanto, a minha avó só não é um avião porque não tem rodas. E se ela tivesse fogo no cu era um foguetão”.
Mas a verdade é que a ciência (empírica) é feita com estatísticas (ver indução). E as estatísticas implicam necessariamente um juízo universal em que há regras, e admite-se por princípio que possam haver excepções às regras.
Quando se invoca o sucesso de um resultado para obliterar ou escamotear os erros do método seguido — então segue-se que ou o método normalmente seguido está errado e necessita de ser reanalisado, ou estamos perante um resultado que é uma excepção indutiva à regra do método.
Afirmar que, em ciência, não é possível argumentar com sucesso, é um absurdo. Completo absurdo.
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