O Domingos Faria invoca um burro com um alvará de inteligente que escreveu um livro, para citar um argumento que coloca em causa o princípio da razão suficiente de Leibniz (e não de Espinoza, como escreveu o Domingos Faria) que reza assim:
“Nenhum facto pode ser verdadeiro ou real, ou nenhum juízo pode ser correcto, sem uma razão suficiente.”
Há vários erros no raciocínio do burro letrado, mas talvez o principal seja o exarado no ponto 5:
“Se S é necessária, então P é necessária. [de PRS e necessidade da implicação]”
Acontece que se uma Causa Primeira é necessária, não se segue que um determinado efeito (dessa causa) seja necessário— desde logo porque a Causa não se confunde (como seria lógico) com um qualquer seu efeito.
A proposição supra só teria alguma legitimidade “lógica” se a Causa Primeira fosse imanente, ou seja, se ela pertencesse à mesma Realidade dos seus possíveis efeitos (possibilidade ou probabilidade) segundo o princípio da causalidade — mas então teríamos que explicar, por exemplo, por que razão as partículas elementares (que são efeitos de uma Causa, ou seja, existem por uma qualquer razão suficiente) aparecem e desaparecem do universo como que por magia, vindas do Nada e para o Nada.
¿De onde vêm, e para onde vão, essas partículas elementares que aparecem e desaparecem continuamente no universo?
Para qualquer pessoa “inteligente” é difícil aceitar que no centro da Física, que pretende ser a ciência dos fundamentos de todo o universo, as leis da nossa razão deveriam ser anuladas.
E isto porque, ao contrário do que defendeu Einstein, “Deus lança mesmo os dados” — no sentido em que os efeitos enquanto factos têm uma probabilidade objectiva (e não uma probabilidade subjectiva humana, devida à falta de conhecimento científico): a “casualidade” (os acontecimentos “por acaso”) e a “a-causalidade” (aquilo que parece não ter causa) não são expressão dos nossos conhecimentos limitados, mas sim são constitutivas da própria Realidade.
É neste sentido que se fala em probabilidade objectiva, por contraposição a uma probabilidade meramente subjectiva, baseada apenas numa falta de conhecimento das razões causais.
Ou seja, o princípio da causalidade (que é exclusivamente imanente) foi refutado pela própria ciência atómica.
Mas essa refutação não significa que, 1/ não exista uma Causa primeira que determina a existência de uma probabilidade objectiva que pode ser contingente na sua condição de causa segunda, e por isso, 2/ não significa que essa probabilidade objectiva, enquanto efeito, seja necessária. Aqui, David Hume tem razão.
Ademais, o raciocínio do lógico em causa é uma tautologia— a inferência pretende ser sempre verdadeira quaisquer que sejam os valores de verdade atribuídos a priori às proposições.
A lógica não se pode fechar em si mesma e fazer de conta que a ciência não existe. Quando isso acontece, aparecem lógicos burros que escrevem livros. Hoje, vivemos em um mundo em que é legítimo dar a uma pessoa estúpida uma resposta estúpida em relação a uma pergunta estúpida — porque o pensamento e as crenças não coincidem.
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