Está muito na moda dizer: “Eu não concordo!; mas não critico...”. Assim ficamos sempre de bem com o mundo. A “tolerância” é assim transformada em “permissividade”.
Por exemplo, quando uma fulana me disse: “Eu não concordo com o aborto, mas não critico quem aborta”. Ou quando o Anselmo Borges diz: “Fulano não concorda com o marxismo, mas diz que o 'marxismo é fascinante'”. A ideia que se pretende fazer passar à populaça é a de que “se não concordas, cala a boca!” em nome da “tolerância”. Pois eu digo: “se não concordas, bota a boca no trombone!”.
“O diálogo entre os comunistas e os católicos tornou-se possível desde que os comunistas falsificam Marx e os católicos deturpam Cristo” — Nicolás Gómez Dávila
A ideia do Anselmo Borges segundo a qual “sem Karl Marx não haveria uma Doutrina Social da Igreja Católica” (naturalmente que ele diz que “foi o outro que disse isso!, não fui eu!”) é a mesma coisa que dizer, por exemplo, que “sem a revolução burguesa de 1789, não haveria Doutrina Social da Igreja Católica”; ou que “se Jesus não tivesse vivido, não haveria o papa Chico”. Ou que “se a minha bisavó tivesse asas era um Boeing 747”. Só quem não leu a encíclica Rerum Novarum pode dizer que existe uma qualquer recôndita ligação ideológica entre Karl Marx e a Igreja Católica (como insinua o Anselmo Borges).
Para além da “permissividade” de que falei acima, hoje está na moda citar outrem ao mesmo tempo que se diz que “não concordo necessariamente com ele”; ou então cita-se alguém, mas sem qualquer comentário acerca da citação. É uma forma de se transmitir a ideia que se pretende, mas sem se comprometer ideologicamente. Como dizia a Ivone Silva: “Com simples um vestido preto, nunca me comprometo!”. É uma manifestação de esperteza saloia; e, nesta matéria, o Anselmo Borges é pós-doutorado.
Hoje existe disseminada a ideia de que “um católico deve ser um marxista mas sem a violência que Karl Marx defendeu”. Ou seja, alegadamente um católico deve ser uma espécie de “marxista pacífico”. Os católicos actuais deturpam Jesus Cristo. É neste sentido estrito que o papa Chico, o cardeal bávaro Marx e o Anselmo Borges, entre outros, são marxistas. Por isso é o cardeal Marx e o Anselmo Borges absolvem o Karl Marx — porque a nova utopia é a de “um marxismo sem violência”.
A falácia do Anselmo Borges e do cardeal Marx revela-se na transposição literal — que ambos fazem — da teoria de Karl Marx que se referia à relação entre o proletariado e o capitalismo industrial, por um lado, para a relação que existe hoje entre os movimentos sociais e o capitalismo global, por outro lado.
O cardeal Marx escreve (com a aquiescência bovina no Anselmo Borges):
“Hoje começamos a ver os efeitos sociais, políticos e ecológicos que o capitalismo mundial, global e desenfreado tem. E a doutrina social católica nunca negou a análise marxista do capitalismo e das ameaças que dele decorrem. Karl Marx obrigou a pensar problemas que não estão resolvidos. Isto vale também para o carácter fetichista da mercadoria e a alienação.”
Vemos ali, no trecho, em primeiro lugar, um esboço de como o marxismo tradicional evoluiu para uma nova ideologia (que é marxista, na sua essência) que já recebeu o nome de “Purificacionismo”, que é uma nova versão puritanista do gnosticismo moderno. Sobre o Purificacionismo falarei com mais detalhe noutra altura.
Mas, em segundo lugar, é absolutamente falso que “a doutrina social católica nunca negou a análise marxista do capitalismo”: basta lermos a encíclica Rerum Novarum para percebermos que o Anselmo Borges mente. E a alusão ao “carácter fetichista da mercadoria e da alienação” revela o carácter puritano da nova ideologia Purificacionista que já contaminou a Igreja Católica através do papa Chico e seus acólitos.
O Anselmo Borges escreve:
« (1) Também se deve a Marx perceber que "o mercado não é tão inocente como se apresenta nos manuais dos economistas; por detrás há enormes interesses".(2) Ele mostrou que "os direitos humanos, sem partilha material, permanecem incompletos", exigindo-se, portanto, "atender às relações reais concretas". Ao acentuar o empírico, "ele é um dos primeiros cientistas sociais que devem ser levados a sério". »
Há, na citação supra, duas ideias-força que advém directamente de Karl Marx e que caracterizam também o Purificacionismo: a primeira, a de que o interesse pessoal determina as nossas convicções (porque, alegadamente, são os “enormes interesses que estão por detrás” que determinam as convicções acerca do mercado). Ora, crer que o interesse pessoal determina exclusivamente as nossas convicções, converte-se um uma convicção que pode determinar a nossa acção, e de tal modo que o motivo de toda a convicção chega a ser o exclusivo interesse pessoal. Por isto vemos a lógica abstrusa de que parte o Karl Marx, e que os intelectuais marxistas e Purificacionistas seguem; mas as contradições e as incoerências da ideologia são úteis porque emprenham as crenças simples com mistérios gnósticos (ver estimulação contraditória).
A outra ideia-força Purificacionista (e marxista) é a subordinação de toda a realidade à economia — por exemplo, quando Irene Khan, que foi Secretária-geral da Amnistia Internacional, afirmou, em uma entrevista ao Financial Times (21 de Maio de 2005), que
«se quisermos falar hoje de “direitos humanos”, para a maioria das pessoas do mundo isso não significa grande coisa. Falar de “liberdade de expressão” a uma pessoa que não saber ler um jornal, ou falar em “direito ao trabalho” a uma pessoa desempregada; os Direitos Humanos não significam nada a não ser que se mude alguma coisa nestas matérias».
Ora, isto é exactamente o que Karl Marx, o cardeal Marx, o papa Chico e o Anselmo Borges defendem: a subordinação de toda a realidade — social, cultural, política, metafísica, etc. — à economia.
O que é extraordinário na opinião da (então) Secretária-geral da Amnistia Internacional, é a de que o estatuto de “prisioneiro político”, entendido em si mesmo e na sua condição, é insuficiente para merecer uma campanha humanitária quando há gente esfomeada e desempregada que não presta atenção à condição de “prisioneiro político”. Infere-se que, na opinião da criatura, que a Amnistia Internacional não tem meramente que lutar pelos direitos dos prisioneiros políticos, mas sobretudo tem que lutar por uma mudança económica global.
É claro e evidente que o novo clero instalado no Vaticano é marxista! Mas segue a versão marxista actualmente falsificada que é o Purificacionismo. Mas repare, caro leitor: o Purificacionista Anselmo Borges (na linha ideológica do marxismo) defende uma forma de globalismo, embora diferente do globalismo dos neocons americanos, e diferente do globalismo islâmico.
Purificacionistas e os Globalistas do Império estão de acordo em uma coisa: querem acabar com o Estado-Nação e com as identificações nacionais (ou seja, querem acabar com a democracia, porque sem Estado-Nação não é possível a democracia).
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