O José Rodrigues dos Santos pega em dois ou três autores, e traça em volta deles uma teoria através de uma narrativa livresca elaborada que se torna difícil de desmontar. As boas obras de ficção parecem-se com a realidade; mas a semelhança é pura coincidência.
O José Rodrigues dos Santos (entre outros) acredita em uma determinada ideia. ¿E o que é que ele faz? Cria os factos que corroborem essa ideia! É uma espécie de “fake news”, de realidade alternativa que se concentra na obra de dois ou três autores.
O José Rodrigues dos Santos chega à conclusão de que o corporativismo foi uma evolução do marxismo incorporada no fascismo:
“Noutros pontos os fascistas desviaram-se da ortodoxia marxista. Por exemplo, aproximaram-se do revisionismo bolchevista quando abraçaram a ideia soreliana da violência provocada por uma vanguarda e afastaram-se do marxismo e do bolchevismo quando aderiram à ideia baueriana de que o sentimento de nação era para o proletariado mais galvanizador do que o sentimento de classe. Isto levou-os a dizer que a luta de classes não se aplicava a Itália porque esta era já uma nação proletária explorada pelas nações capitalistas. A luta de classes apenas iria dividir a nação proletária, pelo que em vez de conflitualidade deveria haver cooperação entre classes. O chamado corporativismo.”
Parece que, para o José Rodrigues dos Santos, a história das ideias começou no século XIX. Ele vai buscar a sua (dele) teoria a esta outra teoria; ou à Wikipédia.
O corporativismo foi defendido por Durkheim como uma forma superior de solidariedade social, e não consta que Durkheim fosse marxista ou fascista.
O corporativismo é uma herança da sociedade medieval das guildas e das classes sociais vitalícias — e nada tem a ver com o marxismo que só surgiu na segunda metade do século XIX.
É verdade que o desenvolvimento histórico-político do conceito de "Vontade Geral" de Rousseau marcou tanto o marxismo como o fascismo — assim como a "Vontade Geral" influenciou todas as ideias políticas no continente europeu (obviamente excluindo a Inglaterra, que seguiu John Locke).
Porém, enquanto que o marxismo se escorou nas ideias da Esquerda hegeliana, o fascismo foi beber a sua base ideológica ao hegelianismo clássico (Direita hegeliana) --- por exemplo, é nítido que, nos seus escritos, Salazar, embora católico, adoptou Hegel na sua concepção política e na dialéctica histórica; mas não só Salazar: Leonardo Coimbra, por exemplo, foi um hegeliano puro) — ambas as ideologias (fascismo e marxismo) utilizam Hegel, mas de forma muito diferente (materialismo versus idealismo do espírito).
Seria necessário que o José Rodrigues dos Santos (e outros chicos-espertos) entendesse minimamente a história das ideias, antes de “arrotar postas de pescada”.
O fascismo teve ideólogos próprios (por exemplo, Giovanni Gentile, ou Benedetto Croce; e não consta que estes dois ideólogos do fascismo, entre outros, fossem marxistas!); não foi Mussolini que moldou a ideologia fascista. Afirmar que “a ideologia fascista se deveu a Mussolini” (como implicitamente faz o José Rodrigues dos Santos, entre muitos outros intelectuais de Wikipédia) é um erro de palmatória.
A ideologia fascista é independente do facto de Mussolini se ter classificado a si próprio de “marxista” no tempo em que militou no Partido Socialista Italiano.
Foi o fascismo, enquanto ideologia, que engendrou Mussolini como seu Capo; e não foi Mussolini que engendrou o fascismo.
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