O raciocínio retorcido (“Spin”) do Pacheco é o seguinte: o Galamba e o Pinheiro mentiram na CPI (não foi só o Galamba que mentiu: Tu Quoque, Pinheiro!), mas a verdadeira culpa é dos arruaceiros do CHEGA que intoxicaram não só a opinião pública, mas também os comentadores e os jornalistas.
“Se pensam que o efeito negativo das mentiras de Galamba e Pinheiro são os únicos estragos causados nos portugueses, não se esqueçam do efeito arruaceiro de como alguns deputados intervêm na CPI.”
Mas o “spin” do Pacheco vai mais longe: segundo ele, quem está a “estuporar a democracia” é a oposição ao governo... ou seja, o monhé faz merda da grossa (nomeadamente quando não ouviu o presidente da república acerca do Galamba), e a culpa é do conceito subjectivo pachequista de “arruaceiro”... !
O Pacheco, o arruaceiro-mor do reino, que depois do 25 de Abril de 1974 foi visto (por muita gente) a fugir à frente da polícia do Porto na Manif do dia 1º de Maio, não admite uma oposição ao “amigo Costa” que não seja suave e compreensiva em relação às mentiras do Galamba. “O Galamba mentiu na CPI, mas não exageremos!”.
Isto é de um cinismo sem possível classificação de grau, ou um cinismo que se aproxima do grau absoluto — é a singularidade pachequista.
Em termos matemáticos, uma “singularidade” é o ponto em um determinado domínio de uma função no qual o valor da função se torna indefinido. Em uma singularidade típica, a função “aponta para o infinito”, ou seja, na área em torno da singularidade o valor da função aumenta à medida em que este se aproxima daquela ― quanto mais próximo da singularidade, maior é o valor; quando o valor chega à singularidade, torna-se infinito. Em termos da lógica, a singularidade aponta para o absurdo de uma função.
Na astrofísica, o buraco-negro é também referido como uma “singularidade”. Quando a matéria de uma estrela em fim de vida é comprimida para além de um terminado ponto — conhecido como “radius de Schwarzchild” —, torna-se impossível a alguma coisa escapar à sua gravidade, produzindo um ponto de massa de uma “densidade infinita”. Na singularidade, as leis da Física (e da ciência em geral) deixam de ser aplicáveis.
O cinismo do Pacheco aproxima-se da respectiva “singularidade” que é um buraco-negro da política.
É a inversão revolucionária da culpa (a inversão do sujeito/objecto): a culpa da acção negativa dos revolucionários é sempre das respectivas vítimas, porque estas não compreenderam as noções revolucionárias que levariam a um inexorável futuro perfeito e destituído de qualquer “mal dos arruaceiros”.