A palavra “inclusivismo” não existe no dicionário; mas deveria existir, por oposição ao substantivo “exclusivismo”, que existe no mesmo dicionário.
“Inclusivismo” pode ser definido como “qualidade daquilo que é inclusivo”; “espírito de inclusão”; “prática que inclui ou pretende incluir outros”.
Assim como o exclusivismo radical conduz ao choque entre seres humanos e entre culturas, o inclusivismo radical — demonstrado aqui pelo Anselmo Borges — conduz a idênticas consequências. Por exemplo: o Bem e a Beleza, que normalmente se complementam e/ou se harmonizam, excluem-se mutuamente se o Bem serve de pretexto para a inveja, e a Beleza serve de pretexto para a luxúria.
“Assim, o crente, o agnóstico, o ateu, em vez de se excluírem, devem encontrar-se e enriquecer-se mutuamente num conflito dialógico de razões, e, por paradoxal que pareça, num diálogo sincero e aberto, concluirão que há entre eles muito mais sintonias do que poderiam supor à primeira vista.”
Ora, é objectivamente impossível que um ateu e um católico praticante se encontrem para se “enriquecerem mutuamente num conflito dialógico de razões”: isto só passa pela cabeça de alguém que padece de uma doença cultural contemporânea a que podemos chamar de “inclusivismo radical” que, em parte, advém do sincretismo religioso pós-modernista que acredita que é possível harmonizar (maçonicamente), por exemplo, as mundividências de um mufti maomedano, por um lado, e de um pároco católico, por outro lado.
Por exemplo: um “encontro” entre o matemático e professor universitário católico John Lennox, por um lado, e o zoólogo ateu Richard Dawkins, por outro lado — não teria nunca, jamais, como corolário, “o enriquecimento mútuo em um conflito dialógico de razões”: este encontro teria apenas como vantagem o possível esclarecimento dos espectadores que assistissem a esse “conflito dialógico de razões”.
Uma coisa é a coexistência, pacífica por natureza; outra coisa é o inclusivismo contra-natura.
Esta mania da inclusividade radical é uma forma de expressão cultural de um relativismo doentio, porque pretende tornar sincréticos, e complementares, doutrinas e mundividências que se excluem radicalmente (basta lermos o Alcorão e o Novo Testamento, para vermos a diferença inconciliável); seria como pretendêssemos elaborar um sincretismo doutrinal entre o marxismo, por um lado, e o a escola austríaca de economia, por outro lado: uma impossibilidade objectiva. Mas, para o Anselmo Borges, provavelmente é possível o sincretismo ideológico entre Karl Marx e Ludwig Von Mises.
O que o Anselmo Borges pretende (Vanitas vanitatum et omnia Vanitas), com este inclusivismo radical, é que o vejam como um “Padre modernaço”, progressista, arejado, avesso a velharias e ao ranço da cultura antropológica, um homem de vistas largas que ambiciona que o povo o repudie e que a imprensa o elogie, liberal na mundividência — Fernando Pessoa escreveu: “para se ser liberal é preciso ser-se inimigo do povo, não ter contacto nenhum com a alma popular, nem a noção das noções instintivas que lhe são naturais e queridas” (“Do Sufrágio Político e da Opinião Pública”).