Pode-se verdadeiramente crer em alguma coisa e admitir, ao mesmo tempo, que aquilo em que se crê é duvidoso e incerto?
Isto leva-nos ao problema de termos de considerar o cepticismo como uma forma de dogmatismo — na medida em que o cepticismo é uma crença absoluta na dúvida. O cepticismo pode ser dogmático e, por isso, pode ser fanático.
A história das ideias ensina-nos que raros são os filósofos que, por mais subtis e geniais que sejam, não cedem mais cedo ou mais tarde à tentação do dogmatismo. Até na ciência existe dogmatismo: por exemplo, a interpretação darwinista da macro-evolução (não me refiro à micro-evolução) é uma forma de dogmatismo.
Posto isto, vamos a este texto idiota do João Afonso Machado.
1/ o dogma da infalibilidade do papa foi estabelecido no século XIX, no seguimento do ataque da maçonaria ao Vaticano. O dogma da virgindade de Maria também é do século XIX. Os outros dogmas da Igreja Católica, em geral, nasceram praticamente com a Igreja da Antiguidade Tardia. Portanto, há que situar os dogmas da Igreja Católica em contexto e no tempo.
2/ o dogma da consubstanciação da Eucaristia, por exemplo, não tem o mesmo valor do que o dogma da infalibilidade do papa, pelas razões explicadas acima.
3/ o primeiro a violar o dogma da infalibilidade do papa foi o próprio papa Bergoglio. A partir do momento em que o próprio papa viola ostensiva- e propositadamente o dogma da infalibilidade do papa, nenhum católico tem a obrigação de respeitar do dogma da infalibilidade do papa no que diz respeito a este papa.
No tempo em que o papa ainda não era infalível — isto é, antes de finais do século XIX — São Roberto Belarmino escreveu o seguinte:
“Tanto quanto está autorizado a resistir a um Papa que comete uma agressão física, do mesmo modo que é permitido resistir-lhe se faz mal às almas ou perturba a sociedade e, com mais forte razão, se procurasse destruir a Igreja — é permitido, digo, opor-se a ele não cumprindo as suas ordens e impedindo que a sua vontade seja realizada.
Não é lícito, contudo, julgá-lo em tribunal, impor-lhe punição, nem o depor, pois estes são actos próprios a um superior”.
— São Roberto Belarmino, De Romano Pontifice, Livro II, Capítulo 29.
4/ portanto, na medida em que o próprio papa Bergoglio contrariou e negou o dogma da infalibilidade do papa; e tendo em conta a tradição da Igreja Católica expressa nomeadamente no texto do Santo supracitado — uma crítica racional ao papa Bergoglio pode ser legítima.
5/ a única forma segura de fugirmos a um qualquer dogmatismo é agirmos como o asno de Buridan — que parece ser a posição do João Afonso Machado.
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