terça-feira, 31 de maio de 2022

O infortúnio da marxista Raquel Varela


Quando leio este escrito (e outros) da Raquel Varela, parece-me estar a ler um artigo do jornal revolucionário estudantil do meu tempo de faculdade, no fim da segunda metade da década de 1970. Porém, aquilo que é tolerável num miúdo de 18 anos, deixa de o ser em uma pessoa de 40.

O mundo não é perfeito; mas a Raquel Varela, nos seus 40, parece pretender a perfeição do mundo em nome de uma certa ideologia, e, por isso, revolta-se contra o mundo porque este não corresponde ao que (alegadamente) deveria ser.

Aquilo que poderia parecer (por parte da Raquel Varela) uma crítica social viável, razoável e plausível — transforma-se em uma hipérbole por intermédio de um radicalismo ideológico próprio de uma adolescente.

O que mais me espanta, na Raquel Varela, é a recusa radical da Natureza Humana; a ideia implícita segundo a qual “é possível haver uma outra Natureza Humana”.

Ora, a tentativa de construção de “uma outra Natureza Humana” foi o que se fez no século XX com as revoluções que causaram centenas de milhões mortes... e, ainda assim, a Raquel Varela — imbuída de uma superioridade moral em relação ao comum dos mortais — defende a construção dessa “outra Natureza Humana” que rejeita a estrutura da realidade, em uma crítica niilista (uma espécie de Teoria Crítica) e radical, criando uma “segunda realidade” que se sobrepõe à natureza das coisas e à realidade propriamente dita.

A deformação do real — e a recusa da Natureza Humana — levou à edificação dos sistemas ideológicos que mataram centenas de milhões de pessoas no século XX.

Sobre a realidade objectiva, um cristão diria o seguinte:

Meu Deus, dá-me a serenidade
para aceitar aquilo que não posso mudar,
a coragem para mudar o que for possível,
e a sabedoria para saber a diferença.

(Reinhold Niebuhr)

Para um revolucionário (Hitler, o revolucionário, do alto do seu palanque comicial, berrava: “Alles Muss Anders Sein!”), não existe essa diferença entre o possível (o que se pode mudar) e o impossível (por exemplo, aquilo que faz parte da Natureza Humana e que não pode ser mudado).

Por isso é que qualquer crítica social, vinda Raquel Varela, é uma espécie de defesa de uma política de terra queimada — como se fosse possível destruir a sociedade inteira para depois, a partir das cinzas do niilismo revolucionário, fazer renascer um “homem novo” com “outra Natureza Humana”.

A tragédia do marxista vencido degenera em um infortúnio patético — porque o marxismo (épico e romântico) ignora a categoria do “trágico”. Na hora de ser fuzilado, seja pelos seus compagnons de route, seja pelos seus inimigos, o marxista morre estupefacto.

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