No seguimento deste meu verbete, o professor de filosofia Rolando Almeida escreveu um comentário que pode ser lido aqui, ou aqui em PDF depois de corrigido para português correcto. Segue-se a minha resposta ao comentário de Rolando Almeida.
1/ O facto de a Direcção da Escola atribuir as turmas a um professor, não significa que os critérios de ensino sejam de tal forma subjectivos que o professor possa afirmar literalmente que “os alunos são meus”.
2/ Em relação a Peter Singer: ou o Rolando Almeida desconhece os escritos do professor australiano que ensina na Universidade de Princeton (quando não deveria ensinar), ou está de má-fé. Sendo o Rolando Almeida um professor de filosofia reconhecido pelo sistema de ensino, tenho que concluir que, neste caso, ele age de má-fé.
Para que o leitor possa ter uma ideia daquilo que Peter Singer pensa e ensina, pode consultar até a Wikipédia em inglês — porque a Wikipédia brazuca nem vale a pena ler!
3/ Escreve o Rolando Almeida:
“Mas vamos supor que Singer até defendia, como alguns filósofos o fazem, que não existe qualquer problema moral no infanticídio em determinadas circunstâncias? Segue-se daí que não devam ser abordados tais argumentos quando se pensa filosoficamente sobre o assunto, mesmo em aulas do secundário? Com que seriedade se eliminam uns autores e se aceitam outros? Foi capaz de pensar nisto antes de escrever a parvoíce que escreveu?”
Para o Rolando Almeida, e por exemplo, o livro “Mein Kampf” de Adolfo Hitler poderia ser disponibilizado para leitura dos seus (dele) alunos sem uma interpretação em contexto. Eu penso que o “Mein Kampf” de Hitler não deveria ser sequer matéria de discussão em uma aula de filosofia; mas seguindo o critério do Rolando Almeida — segundo o qual “não é sério eliminar uns autores e aceitar outros” — não seria lógico que dissociássemos o autor Adolfo Hitler, por um lado, da sua obra filosófica, por outro lado (porque o “Mein Kampf” contém, em si mesmo, uma determinada mundividência e, por isso, uma filosofia).
O que me surpreende é que o “parvo” seja eu. O recurso ao ataque ad Hominem é uma falácia lógica que qualquer professor de filosofia deveria evitar.
Se se quiser ensinar Peter Singer em aulas de filosofia para adolescentes, as ideias do autor australiano não devem ser parcialmente “branqueadas” — ou seja, não se deve esconder o facto, por exemplo, de Peter Singer comparar um feto humano com um peixe.
4/ Eu não tenho nada pessoalmente contra o Rolando Almeida — que eu nem sequer conheço. O meu ataque e ideológico, e não é ad Hominem.
5/ Em filosofia, a mundividência do autor deve ser o ponto de referência do ensino da sua obra. Por exemplo, não é aconselhável ensinar Hegel senão a partir da sua (dele) mundividência que consiste na unidade dialéctica e a identidade do finito e do infinito. Só a partir deste ponto cardeal da sua (dele) mundividência se desenvolvem as teorias e o sistema hegeliano. Por isso, não é admissível que um professor de filosofia diga aos seus alunos que Peter Singer é um “altruísta” — mesmo que ele defenda um altruísmo utilitarista — quando o australiano defende (por exemplo) a ideia segundo a qual o feto humano tem o estatuto ontológico de um peixe.
6/ Os tempos estão a mudar. O relativismo do Rolando Almeida em relação à vida humana (por exemplo, explicitamente em relação ao aborto), em um tempo de depressão demográfica, coloca a mundividência do Rolando Almeida fora de moda. E é talvez isso que o preocupa e deve preocupar.
Adenda: ler os comentários do professor Rolando Almeida aqui.
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