domingo, 27 de setembro de 2015

A “literatura feminina”

 

“Acordei à uma da manhã para chorar, despi-me e nua, sentado na cama, chorei.”

Imaginem que eu tinha escrito este post, muitas pessoas pensariam que eu tinha ensandecido, que andava a tomar a pílula (Prozac), ou que estava a escrever de um campo de refugiados sírios em Munique.

A mesma frase, porém, no feminino, não choca. Pelo contrário, estimula a imaginação. Porquê?

o Quim e a literatura no feminino

¿Por que razão “a mesma frase, no feminino, não choca”?


acordei-nua-e-chorei

Em primeiro lugar, ninguém coloca o despertador para a uma da manhã, para chorar. Pode-se acordar à uma da matina por acaso, e depois apetecer chorar. Mas a nudez não é a condição do choro: não é preciso que alguém se ponha nu para poder chorar — nem sequer numa mulher: poderíamos alegar que ela estivesse “com o penso” para acordar à uma da manhã para chorar nua — mas seria irracional: normalmente, uma mulher “com o penso” não se põe nua em cima dos lençóis, a não ser que use tampão.

Portanto, a mesma frase dita no feminino, choca porque não tem nexo. E dita no masculino também choca, quanto mais não seja porque é uma frase muito gay; mas choca sobretudo porque não tem nexo que alguém (seja homem ou mulher) acorde propositadamente à uma da matina e que precise de se despir para depois chorar.

E são as próprias mulheres que acordam à uma da manhã para chorarem nuas, que denunciam o sexismo.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Neste blogue não são permitidos comentários anónimos.