terça-feira, 5 de julho de 2016

O liberal Henrique Raposo é contra os referendos

 

“Se a democracia directa é veneno, um referendo à Brexit é 605 forte, ideal para suicídios. E “suicídio” é mesmo a palavra certa. Para começar, é o suicídio da própria ideia de democracia. Impressiona ver como ninguém contesta um referendo que colocou 17 milhões contra 16 milhões, impressiona ver como a maioria das pessoas encara um decisão política como se estivéssemos perante um jogo de futebol, como se ganhar por um fosse suficiente para uma decisão desta magnitude, no fundo, impressiona ver a derrota silenciosa da democracia constitucional, representativa e liberal perante a barbárie da democracia directa. Isto não é democracia. Um referendo não é democracia.

Um referendo, sobretudo um referendo que aborda questões dramáticas como a secessão de uma confederação de estados, não é a democracia que desenvolvemos no Ocidente”.

Henrique Raposo

Muitas vezes fico espantado com os “liberais” que temos. Vejam como o Henrique Raposo confunde Democracia Directa, por um lado, com Democracia Participativa, por outro lado. Hoje, ser liberal é não confiar no povo; e se não confiam no povo, melhor seria que os liberais fossem coerentes e assumissem o absolutismo político.

Segundo o raciocínio do Henrique Raposo, o referendo do Brexit foi mau porque “colocou 17 milhões contra 16 milhões”; a) chegamos à conclusão de que a maldade do referendo está no seu resultado, e não no referendo em si mesmo: se o resultado do referendo fosse de 32 milhões contra 1 milhão, o Henrique Raposo já não teria problemas com o referendo do Brexit; b) mas, simultaneamente, o Henrique Raposo utiliza o resultado do referendo para criticar todos os referendos, entendidos em si mesmos.

Ficam algumas perguntas: ¿por que razão “o referendo não é democracia”? ¿O que é “a democracia que desenvolvemos no Ocidente”? O Henrique Raposo não dá respostas; a visão que ele tem da democracia é dogmática.

A teoria do Contrato Social foi inventada no século XVII (Hobbes, Locke) e no século XVIII (Rousseau). Não sei se o Henrique Raposo (e os liberais) se deu conta de que, há trezentos anos, não havia nem Internet nem globalização. Quem se atém religiosamente à doutrina clássica do Contrato Social não se actualizou: o mundo mudou, mas parece que continuamos a viver no século XVIII. O Contrato Social foi criado basicamente por três razões:

1/ combater a arbitrariedade do Poder;
2/ afirmar a ordem social como resultado de uma convenção (contra Aristóteles);
3/ combater o direito divino dos reis.

Hoje, em vez de combater “o direito divino dos reis”, o Contrato Social serve para combater o “direito divino da classe política”. E em tudo, os três pontos supracitados mantêm-se válidos: o que mudou são os meios e instrumentos da sua aplicação.

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