O José Pacheco Pereira escreveu um artigo no jornal Púbico com o título “O mundo é dos brutos — a ascensão da violência e a queda da empatia”. A crítica do José Pacheco Pereira resume-se, mutatis mutandis, a um tipo de sociedade que institucionaliza “a pena de morte, a tortura, censura, ausência de direitos, em que todos são indefesos face aos mais fortes” (sic).
Ora, aquela elite que trabalha afanosamente para a “queda da empatia” (atomização da sociedade) é a mesma que se assume como concordante com o artigo do José Pacheco Pereira: é isto o que os anglo-saxónicos chamam de “SPIN”.
Por exemplo, a pena-de-morte, entendida como a legitimação da afirmação cultural de um acto gratuito, é hoje praticada mediante o aborto “a pedido da freguesa”, o que revela de facto uma “queda de empatia” na cultura antropológica do Ocidente; mas não tenho dúvidas de que o José Pacheco Pereira, como bom esquerdista, é a favor da prática social e cultural do aborto.
Ou seja, a Esquerda pratica o crime cultural procurando não deixar impressões digitais, e acusando os outros daquilo que ela própria faz.
O mesmo se passa com a eutanásia “a pedido do freguês” (defendida pela Esquerda), que rapidamente se transforma em uma pena-de-morte utilitarista e prescritiva. Porém, as mesmas pessoas que defendem a eutanásia são as que vêm a terreiro dizer que “os brutos são os outros que não concordam connosco”.
O maniqueísmo da Esquerda não é baseado em factos (intersubjectividade): em vez disso, é baseado em sentimentos, em subjectividade e mundividência (muitas vezes psicóticas ou fundamentadas por uma Fé Metastática) circunscritas a um determinado grupo cultural elitista.
O maniqueísmo da Esquerda é uma transposição do maniqueísmo gnóstico da Antiguidade Tardia, em que os Pneumáticos iluminados (de Esquerda) “se salvam”, ao passo que os Hílicos (os brutos, que não alinham ideologicamente com os iluminados) se perdem no curso da História, e deveriam ser mesmo eliminados.
Por exemplo, o José Pacheco Pereira critica Comte e as consequências do Positivismo; a Esquerda racionalista (Carlos Fiolhais, e quejandos) venera o Positivismo de Comte; e, no entanto, esta Esquerda afirma que concorda com o Pacheco Pereira. É um SPIN vergonhoso.
O texto do Pacheco Pereira é “reaccionário”, entendido no sentido da filosofia comunitarista; poderia ter sido escrito por A. MacIntyre, Michael Walzer, ou Charles Taylor — o que está nos antípodas do que pensam os compagnons de route do Carlos Fiolhais.
No blogue Rerum Natura não há outra coisa senão “deslumbramento tecnológico” e científico positivista (por exemplo, o Galopim e o Eugénio Lisboa), e anti-religião. O impacto da ciência sobre a religião aconteceu no século XIX; o que acontece hoje é o impacto da técnica sobre a imaginação dos imbecis elitistas que pretendem construir um putativo Mundo Novo nietzscheano que tenta transformar a Natureza Humana — porque as opiniões mudam, a elite esquerdista, relativista e imbecil crê que as verdades mudam também.
Para não pensar no mundo que a ciência descreve, a elite positivista esquerdista embriaga-se de técnica. O técnico crê-se superior aos demais porque sabe o que, por definição, qualquer pessoa pode aprender. Esperar que a vulnerabilidade crescente de um mundo exponencialmente integrado pela técnica não exija um despotismo total, é mera estupidez.