segunda-feira, 19 de maio de 2014

A nova esquerda ilógica e a atomização da sociedade

 

A nova esquerda confunde-se com um certo libertarismo dito de “direita” que se consubstancia, em Portugal, no Partido Social Democrata de Passos Coelho e na ala do CDS/PP de Paulo Portas. A ala do CDS/PP de Paulo Portas fecha a esquerda à direita.

Nos Estados Unidos, esta nova esquerda é representada por aquilo que os americanos chamam de “liberals”, cujos ideólogos são provenientes principalmente do mundo académico (decadente), como é o caso de uma tal Clarissa que aqui escreveu o seguinte:

...There are many people out there who feel confused, lonely and lost in a world where modernity is destroying old certitudes, identities and ways of being. Modernity is liberating in the sense that we are a lot less tied to collective identities ascribed to us at birth. Gender identities, normative sexualities, class origins, religious backgrounds still exist, of course. Nevertheless, they are nowhere as binding as they used to be before the advent of modernity. It isn't easy to challenge the identitarian status quo, but it still can be done...

...At birth, you are handed a set of norms that you are supposed to observe as a representative of your gender, social class, religious denomination, etc. You accumulate enough of these collective allegiances and you can guarantee that pretty much every aspect of your life will be defined for you...Modernity is terrifying because it erodes the stability of collective identities.



A ideia dela é a de que “a modernidade liberta” porque destrói certezas, identidades e modos-de-ser. A “modernidade liberta”, segundo ela, no sentido em que estamos menos ligados a identidades colectivas (que incluem a sexualidade determinada pela biologia) definidas pelo nascimento. Para ela, quando a modernidade destrói as identidades pré-determinadas não só pela cultura mas também pela biologia (no sentido em que, na modernidade, a sexualidade também é, segundo ela, auto-determinada pelo indivíduo como uma forma de libertação), essa destruição das identidades pré-determinadas é vista como uma libertação.

Porém, há aqui um problema lógico: não é possível escapar à classificação sem que se dilua a noção de uma coisa (neste caso, a noção de “ser humano”). A definição é inseparável da classificação – e é por isso não se pode dar uma definição de um individuo, ou de uma unidade, enquanto tal. A ideia segundo a qual a destruição das identidades colectivas liberta o ser humano (enquanto indivíduo) da classificação (porque a classificação é sempre colectiva) corresponde à ideia de que não deve haver uma definição de “ser humano”, e que a ausência de uma definição de “ser humano”  é libertadora. Um absurdo!

Por outro lado, o facto de se destruírem (alegadamente: vamos dar de barato que essa destruição é real) identidades pré-determinadas, não significa que não se criem, por essa via, outras identidades pré-determinadas; o facto de eu querer destruir as minhas identidades pré-determinadas pela cultura e/ou pela biologia, não significa que eu me liberte, por essa via, de uma pré-determinação que consiste na minha negação dessas identidades e na assunção de outras identidades.

Quando eu assumo uma identidade diferente daquela que me é atribuída pela cultura ou pela biologia, essa entidade alegadamente diferente não deixa também de ser pré-determinada — porque a minha existência, em si mesma, tem sempre uma componente de determinação (não é completamente aleatória).

Por fim, o tipo de “libertação” que a nova esquerda defende conduz à atomização da sociedade que é porta aberta para uma qualquer nova forma de totalitarismo.

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