segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Desta vez não critico o cardeal Bergoglio

 

Tem havido muita crítica por parte dos ditos “tradicionalistas” católicos — os "católicos fervorosos" — contra o facto de o cardeal Bergoglio ter presidido a um casamento católico colectivo de 20 casais no Vaticano, sendo que parte dos nubentes já coabitavam e tinham filhos (esta é uma das críticas). Outra crítica é a de que as noivas iam vestidas de branco, quando — diz-se — não eram “puras e virgens”.

Desta vez não estou de acordo com as críticas: não por minha subjectividade, mas porque li as epístolas de S. Paulo e algumas obras de Santo Agostinho. Devemos criticar o cardeal Bergoglio naquilo em que ele é criticável, e não transformá-lo no “bombo da festa”, a “torto e a direito”.

casamento colectivo

No tempo de S. Paulo, era vulgar que as comunidades cristãs — a Igreja Católica primordial — celebrassem o matrimónio (muitas vezes casamentos colectivos eram prática comum entre as primeiras comunidades de cristãos) de gentios pagãos que coabitavam e tinham já filhos. Por isso é que, para a Igreja Católica, o casamento é um sacramento; aliás: basta que um casal seja baptizado para que a sua coabitação seja sacramentada — como diz aqui o Padre Paulo Ricardo: o casamento de baptizados é mais uma confirmação do próprio baptismo, por um lado, e por outro lado é mais um sacramento que confirma o baptismo.

Para além de S. Paulo, outra figura incontornável da Igreja Católica é Santo Agostinho.

Para além das suas obras “Confissões” e da “Cidade de Deus”, que ainda existem em algumas livrarias boas, há dois escritos que desapareceram dos escaparates e que herdei de um tio meu, escritos em português vernáculo: “De Trinitate” (tradução do princípio do século XX), e o “Comentário à Primeira Epístola de S. Paulo”. O pensamento de Santo Agostinho é do melhor que tenho lido.

No “Comentário à Primeira Epístola de S. Paulo”, Santo Agostinho diz que a “união natural” (sexual) é boa, entendida no contexto da criação dos dois sexos, segundo o Génesis. Segundo Santo Agostinho, o bem do casamento não é somente a “procriação” (que significa “colaboração com a obra do Criador”), como considerava Clemente de Alexandria, mas também a “união indissolúvel” que representava simbolicamente a união de Cristo com a Igreja.

E agora prestem boa atenção: segundo Santo Agostinho, a virgindade não é um bem absoluto!, embora seja “a melhor das coisas boas”: ou seja, a virgindade é preferível, mas o casamento é um bem em si mesmo, e esse bem não depende da virgindade.

Essa ideia de que “as noivas não virgens não podem vestir de branco porque já não são virgens”, é uma concepção da cerimónia do casamento que o próprio Santo Agostinho não subscreveria.

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