quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O Trotskismo burguês da Raquel Varela

 

“A grande frente que temos que fazer, desde logo, é com os trabalhadores alemães que têm os seus salários congelados há mais de 10 anos.

A maior tragédia do século XX, a degeneração da revolução russa e a II Guerra mundial, deve-se à ausência dessa frente, porque a revolução alemã de 1919 e 1923 foi derrotada e levou à degeneração burocrática e ditatorial do estalinismo.

Era evidente que a Rússia atrasada e a escassez que daí advinha não iria dar outra coisa se não uma ditadura, porque as mudanças sociais não podem abdicar de ser feitas com os países onde há mais investimento, populações formadas, excedentes criados etc. para evitar escassez.


Lá se foi a ditadura do proletariado! O Historicismo é isto: a verdade não é dissociável do espírito do tempo e de circunstâncias históricas específicas, e portanto, para o Historicismo a verdade não pode ser universal nem intemporal. Aquilo que era, para Karl Marx e Engels, a classe revolucionária (o proletariado), passou a ser a pequena e média burguesias alemãs.

A  Raquel Varela pode talvez saber muita coisa de História, mas não me parece que saiba grande coisa de etnologia comparada.

A razão por que a revolução comunista não aconteceu na Alemanha e aconteceu na Rússia (entre 1919 e 1923), teve menos a ver com escassez e com excedentes criados do que com a idiossincrasia cultural — cultura antropológica — dos povos alemão e russo de antanho, por um lado, e por outro  lado devido às situações geográficas de ambos países — assim como o maoísmo pegou de estaca na China devido essencialmente à tradição confucionista (mais uma vez, a cultura antropológica); nem mesmo com a revoltante revolução cultural de Mao Tsé Tung da década de 1960 se conseguiu erradicar a herança milenar do Confucionismo na China que permanece ainda hoje.

Podemos compreender por que razão Karl Popper considerou que o “marxismo científico” não poderia pertencer à  ciência: porque não é falsificável. Os “cientistas marxistas” encontram sempre uma explicação qualquer para o fracasso da suas previsões “científicas”: se não é do cu, é das calças; se não é da pobreza, é da riqueza; se não é proletariado a classe revolucionária, passa a ser a pequena burguesia; etc.. Quando a teoria explica tudo (em qualquer circunstância), então não explica nada.

Escreve a Raquel Varela que “onde há escassez, na vida e nos países, não há liberdade”. Estranha noção de liberdade. Havia claramente mais liberdade em Portugal nas décadas de 1980 e 1990 do que há hoje, e no entanto havia mais escassez naquela época do que há agora (apesar das reclamações actuais da Esquerda). A liberdade não se pode dissociar da dignidade. E vou mais longe: apesar de Portugal ser hoje uma espécie de protectorado, o português comum é, ainda assim, mais livre do que o alemão comum: só quem conhece a realidade alemã sabe do ambiente de medo difuso que actualmente envenena a sociedade alemã.

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