domingo, 29 de dezembro de 2013

A ética sentimental do católico José Luís Nunes Martins

 

“A ética que perde a sua dureza heteronómica acaba em onanismo sentimental” — Nicolás Gómez Dávila

O texto publicado no jornal “I” da autoria de José Luís Nunes Martins é o paradigma da moda católica actual patrocinada pelo cardeal Bergoglio: a ética sentimental.

A ética sentimental é uma ética intencionalista; ou seja, é uma ética que descura a obra (a conduta, o comportamento, as obras objectivas e concretas) e privilegia a intenção da pessoa. O que conta é a intenção, e não propriamente aquilo que se faz. Um exemplo da ética sentimental é a ética de Pedro Abelardo. O problema é que nós não podemos saber com certeza qual é a intenção das pessoas, e acredito mesmo que, por vezes, nem eu próprio consigo discernir as minhas próprias intenções.

A ética sentimental é a “arma” dos relativistas morais que se dizem “católicos” no sentido de destruir a ética cristã. E estão a ganhar a guerra cultural, agora com o apoio de um papa anticatólico. A ironia é que a Igreja Católica elegeu um papa que está apostado em destruir a ética católica.

Vamos ao texto sentimental e relativista de José Luís Nunes Martins.

1/ A “estratégia” retórica passa por entrar no exagero, para depois, criticando o exagero, generalizar esse exagero como sendo a prática ética vulgar. Ou seja, primeiro adopta uma hipérbole; e depois utiliza a falácia da generalização para estender essa hipérbole a todos os católicos:

“Apontamos quase sempre o dedo a quem erra... Condenamos os outros com enorme facilidade. Compreendemo-los pouco, perdoamo-los ainda menos. Mas, será que atirar pedras é o mais justo, eficaz e melhor?

Temos uma necessidade quase primária de julgar o comportamento alheio, de o analisar e avaliar ao mais ínfimo detalhe, sempre de um ponto de vista superior, como se o sentido da nossa existência, a nossa missão, passasse por sentenciar todos quantos cruzam a sua vida com a nossa... condenando-os... na firme convicção de que assim estamos a ajudar... a melhorar.

Comete erro em cima de erro quem se dedica a julgar os erros dos outros....”

Repare-se na falácia da generalização: “apontamos”, “estendemos”, condenamos”; etc.

2/ Depois de hiperbolizar e generalizar, José Luís Nunes Martins passa ao juízo de valor negativo. O juízo de valor negativo é aquele que recusa a formulação de um juízo de valor positivo — mas não deixa de ser um juízo de valor, por ser negativo: é apenas a recusa de fazer juízos de valor o que, em si mesmo, constitui um juízo de valor (embora negativo). Um fenómeno semelhante passa-se com a liberdade negativa e positiva.

O convite de José Luís Nunes Martins é o de que abdiquemos de fazer juízos de valor acerca dos outros, convite esse traduzido na pergunta do cardeal Bergoglio: “¿Quem sou eu para julgar?”.

3/ A lógica de José Luís Nunes Martins é esta: “se todos erramos, incluindo eu, então eu não devo fazer juízos de valor acerca do comportamento dos outros. Ponto final.”

A estratégia (bergogliana e politicamente correcta) é, por um lado, um apelo sistemático à  falácia da misericórdia, e, por outro lado, é a de tentativa de erradicação da culpa e do branqueamento da consciência através da ideia maquiavélica de que “todos erramos e por isso a culpa não faz sentido”.

“É curioso, e uma prova da inteligência comum, que partindo da verdade universal de que todos erramos, nos sirva mais isso para nos desculparmos a nós mesmos do que aos outros... afinal, nós não somos superiores àqueles que passamos a vida a condenar. Por isso, devíamos ser capazes de os desculpar tanto quanto o fazemos a nós próprios. Mais, pode acontecer que alguém tropece, depois de nós, numa pedra que nós não atirámos para fora do caminho...”

Ou seja, “se julgamos o comportamento de alguém é porque nos sentimos superiores a esse alguém”. A ética de José Luís Nunes Martins é desprovida de hierarquia de valores. É uma ética sem hierarquia, em que todos os valores se equivalem. E, por isso, “quem critica outrem incorre em um sentimento de superioridade”. Repare-se na inversão da lógica das coisas: a exigência ética é a negação da própria exigência ética.

4/ Essa falta de hierarquia de valores na ética é traduzida assim:

“Quem erra, faz-se vagabundo. Vai contra a sua vontade mais profunda, afasta-se da verdade. Erramos de cada vez que nos deixamos levar pela tentação das paixões momentâneas, pelos juízos precipitados e levianos... sempre que nos deixamos seduzir pelas falsas e brilhantes luzes das aparências... ao errar afastamo-nos de nós mesmos, perdemo-nos... em vazios.

Acreditamos que as nossas sentenças revelam, através do nosso sempre muito afiado sentido de justiça, a superioridade moral de uma vida acima do comum... quando afinal tal consideração apenas nos afasta, ainda mais, da verdade de nós mesmos.”

Para José Luís Nunes Martins, os erros são todos equivalentes. Tanto erra aquele que frequenta saunas gay como aquele que conta uma mentira. São erros idênticos. “Por isso, não devemos fazer juízos de valor, porque se nós mentimos e nos desculpamos em relação aos nossos erros mentirosos, então o indivíduo que frequenta saunas gay também está, na mesma medida, desculpado”.

5/ Finalmente, o argumento do “amor”, para compor o ramalhete da ética sentimental.

“Nunca faltará quem nos julgue... mas muito mais valioso será quem, com humildade, nos aceite... quem nos ame, apesar de tudo.”

Hoje está na moda, para qualquer coisa, invocar o argumento do “amor”, mas nunca sabemos se o “amor” é a libido, o eros, a filia ou o ágape, porque o amor é hoje um fenómeno exclusivamente subjectivo. Um militante do Bloco de Esquerda escreveu um dia que “o aborto é um acto de amor, porque salva uma relação amorosa”. O “amor” é hoje pau para toda a colher.

O argumento do “amor” subjectivo é a pedra de toque da ética sentimental (ver Pedro Abelardo). Face ao “amor” subjectivo, não há ética que valha, porque o “amor” subjectivo é a própria ética. Perante o “amor” subjectivado, qualquer comportamento está automaticamente justificado. O “amor” subjectivo cilindra qualquer hierarquia de valores, porque o “amor” subjectivo é o único valor ético.

(Ficheiro PDF do artigo de José Luís Nunes Martins)

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